quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Como escrever um artigo para uma revista feminina

Podia afirmar que não existem regras mas aqui seguem algumas linhas de orientação essenciais:

1 – Escolha um assunto actual, ligeiramente picante, comportamental, e não consensual num grupo de 20 pessoas de faixa etária semelhante.

2 – Introduza a temática de forma generalista e seguidamente aprofunde-a ou então, faça o inverso, relate acontecimentos concretos e a partir dai, discurse sobre questões gerais.
O essencial mesmo, é tratar o assunto com toda a naturalidade e não exagerar no número de variáveis. Deve escrever despreocupadamente sobre qualquer assunto, seja este sobre as vantagens do uso de morangos na dieta semanal ou àcerca dos benefícios do uso de meias de liga numa noite de amor intenso (pode substituir o amor por sexo, a escolha é sua).

3 – Não seja moralista. Faça o contraponto das várias perspectivas valorizando sempre os aspectos positivos. Nenhum comportamento deve ser desaprovado. A leitora é uma mulher moderna, livre e independente e jamais toleraria que lhe impusessem um caminho.
Em questões de moda a perspectiva é outra. Em artigos de tendências, a escrita poderá ser bastante agressiva. O importante é orientar as leitoras de forma clara e inequívoca. Se for necessário escrever algo como: “queime as suas calças de ganga à boca-de-sino” não hesite. O nosso objectivo é impedir que mulheres modernas saiam à rua com os saltos altos dos pumps completamente cobertos por um par de calças demasiado compridas.

4 – Tenha em atenção o longo prazo de validade dos artigos de fundo das revistas femininas. Não vai querer que, em Março de 2011, num qualquer salão de beleza alguém com as raízes do cabelo num estado lastimoso, folheie desatentamente a publicação de Setembro de 2010 onde o seu artigo está impresso.
E aproveite a vida: Escreva 12 textos num mês e pesquise novos temas nos restantes 11 meses do ano.

Na próxima semana será publicado um exemplo prático…(e já está escrito)

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Consultório amoroso I ou Guia para cozer um coração

Existem corações frios, corações partidos, palpitantes, moles, de papelão, gélidos e existem ainda corações cozidos – corações que por excesso de calor…cozeram.


Não os confundam com os corações cosidos que são versões melhoradas/remendadas dos corações partidos. A afirmação de que os corações partidos podem ser reconstruídos é verdadeira. Infelizmente não surgiram notícias que indiquem soluções para os corações despedaçados…

Mas não nos vamos dispersar: o assunto de hoje é o coração cozido.
Normalmente o coração cozido é sobrevalorizado e isso acontece porque tendemos a considerar que o calor é uma metáfora para amor, amizade ou qualquer outro afecto. Mas reparem que o excesso de amor pode cozer muitas coisas mas uma delas não será o coração.

Outro problema é o desconhecimento do processo através do qual o coração passou do seu estado cru, e verdadeiro para muitos, para o estado cozido. Não façam isso, são completamente distintos:

- Corações cozidos ao vapor;

- Corações lançados bruscamente em água em ebulição;

- Corações cautelosos que mergulham em águas tépidas depois de se certificarem com uma das aortas de que a água está realmente agradável mas que se deixam embalar por suaves ondulações e cuja reacção para fugirem é tardia face ao imperceptível, lento e constante aumento de temperatura da água;

Finalizo com um conselho:
O importante para uma refeição inesquecível é a frescura dos ingredientes. Escolha bem o coração, verifique que bombeia bem (sem paragens), derrete de quando em quando (de preferência em situações que envolvam animais e crianças) e tem a dureza suficiente para resistir a uma queda equivalente a 9 pisos.

Estatísticas: Neste texto foram utilizadas 16 x as palavras: coração/corações

Quem mora aqui II - O REGRESSO!!!!

Quem?  - A mesma personagem

Aqui? - O mesmo sítio

Mora? - As rendas são caras e por vezes quem esquece-se de pagar a água. Aqui existem algumas formigas e melgas. Mas a vizinhança é simpática e as vistas para além são relaxantes. . É um habitar temporário... e isso é suficiente!

sexta-feira, 4 de junho de 2010

As reprimendas

Os meus conhecimentos de psicologia infantil, pedagogia ou compreensão de métodos de ensino são bastante básicos. Os bons comportamentos devem ser recompensados com um rebuçado e os maus comportamentos com uma estadia de cócoras no canto da sala? A geração com cáries e/ ou rótulas desfeitas, facilitaria a escolha de um individuo para cargos de obediência.

Apenas percebi há poucas semanas qual o efeito de demasiadas reprimendas na obediência.
Vamos colocar a questão da seguinte maneira:

- Imaginemos um boião de bolachas. Podem ser bolachinhas com pedacinhos de chocolate com aspecto muito apetitoso. Isto tudo, para tornar as coisas mais realistas…

A criança é informada que, até ao início do próximo mês, de modo algum poderá consumir aquelas bolachas crocantes, de sabor intenso e com pepitas de chocolate que se desfazem na boca rapidamente…

O boião das bolachas, de abertura fácil, com a iguaria deliciosa é depositado num armário do corredor. A criança, contente com toda a confiança depositada em si, prossegue o percurso sem olhar segunda vez para as bolachas.

Passadas 4 horas a criança torna a percorrer o corredor, ouve:
- Não te esqueças que não podes comer as bolachas!

No dia seguinte:
- Estás a olhar para as bolachas? Não podes comê-las!

No outro dia:
- Vê bem o que fazes! Não posso estar sempre aqui a vigiar!

E mais:
-Quando te aproximares do armário não olhes para as bolachas!
- As bolachas têm de estar ai até ao final do mês!
...

As bolachas continuam no boião, no armário, no corredor. A criança imagina que as pepitas de chocolate cheiram a naftalina e que a massa tem a consistência do arroz espapaçado feito pela avó Irene.

Um dia, a meio desse mês, 2 pequeninas mãos abrem o boião, tiram as bolachas e direccionam-nas para uma boca que as mastiga até meio boião estar vazio. As restantes bolachas acabam caídas junto a uma árvore.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Retratos quase sinceros

Ela não mentia porque achava isso demasiado esgotante...Uma mentira para ela tinha de ser absolutamente indispensável. O trabalho mental e físico necessário para a representação eficiente de uma mentira só se justificava quando a verdade mesmo que ligeiramente maquilhada se revelava demasiado embaraçosa, pessoal e triste.
De quando em quando dizia verdades momentâneas e só mais raramente, verdades futuras...


Ele mentia porque achava que a sua verdade não inspirava confiança. Uma mentira para ele era a forma de evitar ser visto como demasiado leve pelas pessoas que gostava. Desligadas da linguagem do seu corpo, as suas afirmações e respostas repetiam-se tornando-se gastas, pouco apaixonadas e cada vez menos aptas para o resultado pretendido.
Sempre que possível omitia e tentava deixar em pausa as perguntas o tempo suficiente para não ter de responder…

segunda-feira, 8 de março de 2010

Dia da Mulher

Pertenço a um género humano, com útero, formado para albergar uma vida, e com a capacidade de produzir alimento para o desenvolvimento de um novo ser nas primeiras semanas após o seu nascimento. Dadas estas e outras particularidades da minha anatomia terei sempre uma palavra amiga, afável ou tolerante para com aqueles que me rodeiam? Devo ainda ser capaz de realizar várias tarefas ao mesmo tempo e possuir um sexto sentido, uma sensibilidade específica e por tudo isso ainda tenho direito a um dia de enaltecimento!

Faço parte de uma geração de mulheres que espera exactamente os mesmos direitos e deveres dos homens e que fica enfadada ou incomodada com desabafos de mães e tias a relembrarem a pouca ajuda que têm nas tarefas domésticas por parte dos seus esposos.

Mas que fazer quando grupos de tias, avós, mães e primas em jantares de família se atropelam para colocar travessas recheadas em frente aos machos da família? No decorrer dos comentários masculinas a questões políticas, durante as suas sínteses desportivas ou críticas automobilísticas, os pratos, onde apenas restam pequenos ossos descarnados e os talheres tombados para o lado direito, desaparecem para dar lugar a saborosas sobremesas elaboradas por mãos delicadas (ou não) de mulher.

Na prática existem demasiadas questões injustas por isso assinalo este dia. Não para ter um jantar de amigas e assistir a strips masculinos mas para relembrar direitos adquiridos e repensar comportamentos.

terça-feira, 2 de março de 2010

Conspiração

Sei que tudo faz parte de um plano para me lixarem.

Comecei a dar conta disso porque quando lanchava na casa da minha avó comia compota caseira sobre torradinhas e mais tarde a única compota que me ofereciam, encontrava-se encerrada em pequenos caixas plásticas seladas com uma película metalizada, tinha um aspecto pouco cremoso e muito gelatinoso e fazia-me azia. Colocavam os pacotinhos na mesa à minha frente sempre a sorrir muito.

Outra coisa que percebi foi que com o passar do tempo as letras que passavam no monitor do meu computador se tornavam mais pequenas, mais irrequietas e indecifráveis. Nessa altura aquele que dizia que era meu amigo tentava convencer-me a ir ao médico e a comprar óculos. Acho que queria que eu gastasse o pouco dinheiro que tinha em coisas inúteis. Nunca fui…deixei de falar com ele…não por mau feitio mas porque apenas reconheço as pessoas a 2 metros de distância.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

A conspiração das meias – parte 1

Hoje saiu de casa bem cedo…não queria que nada o perturbasse. Preparou tudo cuidadosamente na noite anterior. Tinha a certeza que os sapatos não tinham as solas rotas nem costuras descosidas ou descoladas. Nunca tinha ficado com as meias molhadas e os pés frios…

Na sala com vista para a praça chuvosa, quando lhe falaram de uma crise e da impossibilidade de o contratar, olharam várias vezes para o telemóvel e coçaram distraidamente o couro cabeludo.

Os seus pés mergulharam ainda mais na sola reforçada das meias e achou que era uma boa sensação…como enterrar os dedos na areia molhada da praia. De pé a sensação aumentava. E ao andar a água, antes aprisionada nas fibras de algodão, preenchia os espaços entre as unhas e a pele. Enquanto os seus joelhos se aproximavam estranhamente do peito e a rua passava veloz, tudo era a mesma massa, a água suja da tinta das meias estreadas, misturada com o suor, com resquícios de cabedal.

Parou num café pastelaria frequentado por senhoras de meia-idade, com o cabelo impecavelmente cortado, que sorviam chá e abocanhavam pãezinhos de leite simultaneamente com as mãos e com os lábios descolorados.

Tornou-se mais difícil caminhar, os pés colados ao chão com a pasta húmida que pingava da boca dos sapatos.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Ecologia I

- Não percebo porque é que dizes que ele não é ecológico!

- Tem um carro com 20 anos e faz pelo menos 250km todas as semanas, o escape parece uma chaminé de fábrica no auge da revolução industrial. Demora mais de meia hora a tomar banho, deixa a água a correr enquanto lava os dentes e está se pouco lixando para os jaquinzinhos de 5cm de comprimento que adora devorar todos os sábados ao almoço! 


- Não podes ser tão limitada nas tuas análises. Ele cumpre a política dos 3 Rs na perfeição: Reutiliza o seu discurso vezes sem conta, quem não soubesse até diria que é político. Recicla a roupa do pai sempre que tem uma festa dos anos 60. E claro que reduz o riso sempre que falas.

- Às vezes tens uma piada...Ele tem a consciência ambiental de um depósito de chumbo no oceano à procura de uma boca de peixe-espada prestes ser apanhado e servido em postas numa marisqueira com vista para o mar. Mas está no teu garfo...escolhe se comes ou não.

- Achas que estou a vender a minha alma verde ao diabo?

- Almas verdes na "civilização"...não me parecem que existam.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Visitante nº1000 ou post retirado da gaveta

Este post é mesmo para publicar...mesmo fora do prazo.


Os prazos de validades para as questões e decisões importantes da vida interessam-me. E o saltitar alegremente de assunto em assunto também…

Num copo de iogurte podemos ler qual o prazo de validade do seu conteúdo e de que forma deve ser conservado para essa data ser viável. O iogurte é provavelmente um dos produtos do quotidiano com mais informação associada.

Para se compreender o pouco conhecimento que é proporcionado ao comprador de um espaço para habitação, é comum comparar-se a informação fornecida no acto de compra de um iogurte e de uma casa,  O futuro e maravilhado proprietário do imóvel é também uma pessoa ignorante quanto ao tipo de tubagem utilizada na rede de águas, quanto à existência ou não de isolamentos térmicos e de qual o tipo de pormenores utilizados no remate da cobertura.

Num confronto: pasta láctea açucarada vs sonho de uma vida, ganha o alimento diário dos putos. Uma vez que o melhor do mundo são as crianças, faz algum sentido, não?


Fui a visitante nº1000 deste blog. Já passaram alguns dias, é certo, mas ver 4 algarismos no contador de visitas pareceu-me bem. Na altura não festejei mas um destes dias vou ter direito a 1 fatia de bolo brigadeiro temperada com arrogância.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Alugam-se torres

Houve um tempo em que as raparigas sonhavam que eram princesas em torres e que o seu cavaleiro branco apareceria. Elas estenderiam os seus longos cabelos lisos, pela janela deixando entrar assim o seu amor.

Acontece que estamos no séc. XXI, as princesas saíram das suas torres, e foram conhecer o mundo. Queimaram os corpetes de barba de baleia e optaram por cortes de cabelo mais práticos e desalinhados.

Nos vastos territórios pontuados por torres imaginamos espaços abandonados, repletos de aranhiços e vegetação. Um negócio em potência para a reabilitação e o turismo rural!


Contudo as torres não estão vazias…

Os novos habitantes são versões recentes de princesinhas, ainda mais rápidos a lançarem os longos cabelos a quem passe. Cavaleiros cansados de apanhar chuva, esquecidos das lutas com os dragões, cavaleiros que simplesmente não deixam as suas espadas enferrujar porque as entregam às princesas enquanto lhes dizem:
- Agora podes lutar por mim.

As atitudes das outrora princesas são distintas:

- Algumas pegam nas espadas e combatem com alguém só para demonstrar ao seu amado inseguro que sabem defender territórios;

- Outras pegam nas espadas para expulsar o cavaleiro princesinha da torre;

- Outras, ainda, pousam a espada e chegam a acordo quanto ao preço de aluguer da torre, que tem valor histórico significativo e uma vista fantástica sobre a serra.