segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

A conspiração das meias – parte 1

Hoje saiu de casa bem cedo…não queria que nada o perturbasse. Preparou tudo cuidadosamente na noite anterior. Tinha a certeza que os sapatos não tinham as solas rotas nem costuras descosidas ou descoladas. Nunca tinha ficado com as meias molhadas e os pés frios…

Na sala com vista para a praça chuvosa, quando lhe falaram de uma crise e da impossibilidade de o contratar, olharam várias vezes para o telemóvel e coçaram distraidamente o couro cabeludo.

Os seus pés mergulharam ainda mais na sola reforçada das meias e achou que era uma boa sensação…como enterrar os dedos na areia molhada da praia. De pé a sensação aumentava. E ao andar a água, antes aprisionada nas fibras de algodão, preenchia os espaços entre as unhas e a pele. Enquanto os seus joelhos se aproximavam estranhamente do peito e a rua passava veloz, tudo era a mesma massa, a água suja da tinta das meias estreadas, misturada com o suor, com resquícios de cabedal.

Parou num café pastelaria frequentado por senhoras de meia-idade, com o cabelo impecavelmente cortado, que sorviam chá e abocanhavam pãezinhos de leite simultaneamente com as mãos e com os lábios descolorados.

Tornou-se mais difícil caminhar, os pés colados ao chão com a pasta húmida que pingava da boca dos sapatos.

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